No ecossistema empresarial, é comum associar o termo “Governança Corporativa” a gigantes de capital aberto, com suas estruturas complexas, comitês e relatórios anuais robustos. Para o gestor de uma pequena ou média empresa (PME), focado na operação diária e na luta pela sobrevivência, a ideia de implementar um conselho pode soar como um luxo distante ou uma burocracia desnecessária. Este é um dos mitos mais perigosos e limitantes do mundo dos negócios.
A verdade é que a boa governança não é um privilégio de grandes corporações; é uma ferramenta estratégica fundamental para a sustentabilidade, o crescimento e a perpetuação de qualquer negócio, independentemente do seu tamanho. Esperar a empresa “crescer o suficiente” para só então pensar em governança é como construir um prédio sem se preocupar com as fundações, na esperança de que elas apareçam magicamente quando o último andar estiver pronto.
O principal desafio de uma PME em crescimento é a centralização. O fundador, com sua paixão e conhecimento, é o motor da empresa, mas, com o tempo, ele também se torna seu maior gargalo. Decisões estratégicas, financeiras e operacionais se concentram em uma única mente, criando o que chamamos de “solidão do poder”. Essa dependência de uma só pessoa é um risco imenso, que limita a escala e ameaça a continuidade do negócio na ausência de seu criador.
É exatamente aqui que a implementação de um conselho — seja ele consultivo ou, em um estágio mais maduro, de administração — se torna um divisor de águas. Ao contrário do que muitos temem, o papel de um conselho não é somente fiscalizar ou limitar a autonomia do fundador. Seu valor estratégico é imensurável, atuando como uma caixa de ressonância qualificada que oferece:
- Visão Externa e Imparcial: Conselheiros trazem experiências de outros mercados e setores, oferecendo perspectivas que o gestor, imerso no dia a dia, não consegue enxergar. Eles questionam a coisa como são e ajudam a identificar pontos cegos.
- Acesso a Redes e Conhecimento: Cada membro de um conselho traz consigo sua própria rede de contatos e um conhecimento específico (em finanças, marketing, tecnologia, gestão de pessoas), acelerando a resolução de problemas e a abertura de novas portas.
- Credibilidade e Confiança: A simples existência de uma estrutura de governança formal sinaliza ao mercado — bancos, investidores, clientes e talentos — um nível de maturidade e profissionalismo que diferencia a empresa de seus concorrentes.
- Disciplina e Foco Estratégico: A necessidade de se reportar a um conselho força a gestão a organizar suas ideias, a preparar análises mais profundas e a manter o foco nos objetivos de longo prazo, evitando, desvios causados por crises momentâneas.
Na minha experiência como jornalista corporativa, acompanhando a trajetória de inúmeras empresas, percebo uma verdade incontestável: a implementação de um conselho é o ponto de virada que separa os negócios que somente sobrevivem daqueles que verdadeiramente prosperam e se perpetuam. Independentemente do faturamento ou do número de funcionários, a solidão decisória do fundador é o maior risco oculto de uma organização. Um conselho bem estruturado não é uma despesa; é o mais inteligente investimento na mitigação desse risco e na construção de um legado.
Para as PMEs, o caminho não precisa ser abrupto. Iniciar com um Conselho Consultivo, sem o poder legal de deliberação, mas com o compromisso de oferecer aconselhamento estratégico, é um primeiro passo prático e de altíssimo impacto. Trazer dois ou três profissionais de mercado, cuja experiência complemente a do fundador, já é o suficiente para revolucionar a qualidade da tomada de decisão.
Em suma, a governança não é o destino, reservado somente para os grandes. Ela é o veículo que permite que empresas com potencial possam, de fato, chegar lá.
Andreia Arantes Jornalista Corporativa
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